Em frente ao cemitério

Em frente ao Cemitério da cidade, havia um pega-bêbado, cujo proprietário, que via o desfile dos mortos há anos, afirmava não acreditar na própria morte. Convém salientar, nesse instante, que o mesmo já se encontra rigorosamente morto.

Certa madrugada, vieram uns feirantes lá dos lados de Natuba e me pediram que recitasse uns versos com o cemitério, mas que fosse coisa simples, pois não entendiam de palavras difíceis.

Pedi licença para ir ao sanitário e, quando voltei, recitei uns versos que aprendi com o motorista Amaro Luiz de França, popularmente conhecido como Mário do Bar ou Mário da Praça:

Rezei mais de um mistério

quando pensava na vida

que a diferença da vida

pra morte é um caso sério.

Olhando pro cemitério

com suas portas fechadas

cruz pendida, cruz quebrada

catacumba velha e nova

tudo isso é dando prova

de que a vida não vale nada.

Os matutos meteram a mão no bolso e pagaram a conta. Ficaram contentes com a poesia, recitada em frente ao cemitério.

Fúnebre abraço.

Sosígenes Bittencourt

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