Ary de Resende Barroso (Ary Barroso) nasceu em Ubá – Minas Gerais, 07 de novembro de 1903. Filho do deputado estadual e promotor público João Evangelista Barroso e Angelina de Resende Barroso. Aos seis anos perdeu a mãe, vítima de tuberculose aos 22 anos. O pai Dr. João Evangelista, duas semanas depois sucumbiu à mesma doença. Ary guardaria para toda a vida um grande medo da tuberculose. Órfão de pai e mãe foi morar com a avó materna, Dona Gabriela Augusta de Resende e tia Ritinha (Rita Margarida de Resende). Dona Gabriela e tia Ritinha eram muito religiosas e queriam que Ary se tornasse padre. Conseguiram até que ele aprendesse a ajudar na missa, mas não puderam evitar que, numa noite, ele entrasse na igreja e amarrasse a corda do sino na cauda de um cavalo que mansamente pastava no campinho e o animal deu alegres badaladas enquanto espantava as muriçocas com o rabo…
Estudou teoria, solfejo e piano com tia Ritinha e com doze anos já trabalhava com a tia como auxiliar no piano no cinema ideal.
Em 1920, com o falecimento do tio Sabino Barroso, ex-ministro da Fazenda, recebeu dele uma herança de quarenta contos de réis. Ary arranjou uma noiva que não agradava a família e estava disposto a casar. Ary era teimoso; não casou, cedendo à pressão familiar, mas abandonou Ubá, viajando para o Rio de Janeiro em 1921. Com a noiva Ivone teve os filhos: Flávio Rubens e Mariúza. Morando em pensão de luxo, a vida estava fácil para o jovem Ary. Mas os melhores restaurantes, as melhores bebidas, as roupas mais elegantes acabaram com a herança. Não havia alternativa. Ary teria que trabalhar. Ainda bem que tia Ritinha insistira com suas aulas de piano. Como nos tempos de Ubá, Ary voltou a fazer o fundo musical para os filmes mudos. Das 2 as 6 no cinema Íris; 8 as 10 no Odeon. O esforço rendia-lhe 24$000 por dia, uma pequena fortuna na época.
Era 1932 e Ary Barroso ingressava na Rádio Philips a convite de Renato Murce. A princípio como simples pianista, logo se tornaria locutor, humorista, animador e locutor esportivo. Os programas de calouros de Ary ficaram famosos pelos disparates que os candidatos diziam. E pelo gongo, inovação de Ary que, no princípio, quando o programa começou na Rádio Cruzeiro do Sul (1937), era um sino, Ary brincava com os calouros, fazendo os ouvintes se divertirem com os absurdos ditos ao microfone. Quando passou para Tupi, instituiu o gongo, que era tocado pelo auxiliar de portaria da Rádio, Macalé. O calouro desafinava e Ary fazia um discreto gesto e Macalé já sabia: Gongo nele!
Ary Barroso também era locutor esportivo. Torcedor confesso do flamengo, torcia descaradamente a favor do seu time do coração, nas transmissões que eram feitas pelo rádio, ele se recusava a narrar o gol do time adversário.
Autor de várias músicas como: Aquarela do Brasil, Na Baixa do Sapateiro, Os Quindins de Iaiá, Risque, no Rancho Fundo, Faceira, Morena Boca de Ouro, No Tabuleiro da Baiana, É Luxo Só e tantas outras.
A avenida está colorida de luzes e fantasias. A batida dos tamborins abafa o vozerio da multidão. O suor escorre no rosto sorridente dos sambistas. É carnaval, é domingo, 9 de fevereiro de 1964.
Os diretores da escola de samba Império Serrano correm de lá pra cá tentando reunir o pessoal. Está quase na hora de entrarem na avenida. Aproxima-se o momento decisivo do desfile diante do público e da comissão julgadora. São mais de 2 mil figurantes espalhados na multidão, que é preciso distribuir, ordenar. Uma baiana conversa com um índio. O marquês come tranquilamente seu cachorro-quente. As damas da corte não descobrem maneira de descansar sem estragar os imensos e rendados vestidos.
As alas se misturam, alguns não sabem seu lugar na sequência de quadros. E os diretores frenéticos, pra lá e pra cá, que a hora se aproxima. A turma da “cozinha” cantarola a música do enredo:
“Vejam esta maravilha de cenário é um episódio relicário, que o artista, num sonho genial escolheu para este carnaval. E o asfalto, como passarela será a tela do Brasil em forma de aquarela”…
Aquarela do Brasil chama-se o enredo. Como o famoso samba de Ary Barroso, procura exaltar as belezas e grandezas do país. É um samba-exaltação, como o de Ary Barroso. O desfile da Império Serrano não deixará de ser uma homenagem as compositor brasileiro mais conhecido no país e no exterior.
Quase 11 horas, a escola finalmente está pronta para desfilar. Soam os primeiros surdos. Ensaiam-se os primeiros passos de repente, silêncio. Ficam todos atarantados, ninguém sabe o que fazer; a notícia caiu como um raio: “Ary Barroso morreu”.
Domingo, 9 de fevereiro de 1964, 21:50hs: Ary Barroso morreu de cirrose hepática decorrente do alcoolismo.
A notícia espalha-se de norte a sul, paralisa bailes, silencia foliões, abala o país. Por um momento os tamborins se calam, a multidão se entreolha. A escola de samba Império Serrano hesita em entrar na avenida.
Mas o carnaval não deve parar. Os bailes prosseguem, o povo dança e na avenida a escola desfila a sua Aquarela Brasileira.
É preciso cantar para vencer o silêncio da morte.
AQUARELA DO BRASIL – GAL COSTA
Brasil!
Meu Brasil brasileiro
Meu mulato inzoneiro
Vou cantar-te nos meus versos
O Brasil, samba que dá
Bamboleio, que faz gingar
O Brasil, do meu amor
Terra de Nosso Senhor
Brasil! Pra mim! Pra mim, pra mim
Ah! abre a cortina do passado
Tira a mãe preta do cerrado
Bota o rei congo no congado
Brasil! Pra mim!
Deixa cantar de novo o trovador
A merencória luz da lua
Toda canção do meu amor
Quero ver a sá dona caminhando
Pelos salões arrastando
O seu vestido rendado
Brasil! Pra mim, pra mim, pra mim!
Brasil!
Terra boa e gostosa
Da morena sestrosa
De olhar indiscreto
O Brasil, samba que dá
bamboleio que faz gingar
O Brasil, do meu amor
Terra de Nosso Senhor
Brasil! Pra mim, pra mim, pra mim
Oh esse coqueiro que dá coco
Onde eu amarro a minha rede
Nas noites claras de luar
Brasil! Pra mim
Ah! ouve estas fontes murmurantes
Aonde eu mato a minha sede
E onde a lua vem brincar
Ah! esse Brasil lindo e trigueiro
É o meu Brasil brasileiro
Terra de samba e pandeiro
Brasil! Pra mim, pra mim! Brasil!
Brasil! Pra mim, pra mim! Brasil!, Brasil!
Leo dos Monges