Heloisa Buarque de Hollanda, Helô, como ela gosta de ser chamada, a bela e celebrada musa da Geração 80, a geração de escritores, intelectuais, poetas e artistas, que nos legou a Constituição de 1988, que assegurou a igualdade de gênero no Brasil, é candidatíssima à vaga deixada na Academia Brasileira de Letras pela saudosa escritora Nélida Piñon. Prevejo que terá uma consagradora votação e se tornará, também, por seus dotes de beleza não só intelectuais, a musa da Casa de Machado de Assis. (Machado teve a sua musa, a cantora lírica Augusta Candiani, inspiradora de muitos dos seus escritos).
Aos 83 anos, Helô não para de trabalhar. Continua imprimindo importantes marcas na cultura brasileira. É professora emérita da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde coordena o Programa Avançado de Cultura Contemporânea; pesquisadora, professora de Teoria Crítica da Cultura, crítica literária, conferencista internacional, possui doutorado em Sociologia da Cultura pela Columbia University/EUA, coordena ainda o projeto Universidade das Quebradas e o Fórum Mulher e Universidade. É vista como uma das pioneiras no estudo de teorias feministas no Brasil, tornando-se organizadora de quatro volumes da coleção Pensamento Feminista Hoje, que fortaleceu a rede de valorização do protagonismo feminino. Suas pesquisas privilegiam a relação entre cultura e desenvolvimento, com ênfase nas áreas de poesia, relações de gênero e étnicas, culturas marginalizadas e cultura digital. Tem-se dedicado especialmente ao impacto das tecnologias digitais e da internet na produção e no consumo culturais. É autora de muitos livros, entre eles, Macunaíma, da literatura ao cinema; 26 Poetas Hoje; Impressões de Viagem; Cultura e Participação nos anos 60; Pós-Modernismo e Política; O Feminismo como Crítica da Cultura; Guia Poético do Rio de Janeiro; Antologia Digital e Escolhas, uma autobiografia intelectual.
A primeira vez que nos encontramos, não seria a única, Heloisa Buarque de Hollanda e eu para uma conversa mais demorada, foi na casa dela, numa noite fria de junho, há exatos 15 anos, no bairro carioca do Cosme Velho a poucos metros da casa onde Machado de Assis viveu parte de sua vida. Comigo estavam as escritoras Rachel de Queiroz, imortal da ABL e Luzilá Gonçalves Ferreira, para um encontro marcado, não apenas para jantar. Houve trocas de lembranças: Do Quixadá, território amoroso de Rachel, o Açude do Cedro, a Pedra da Galinha Choca, o Santuário de Nossa Senhora Imaculada, o Morro do Urucu, a Pedra do Cruzeiro, a Serra do Estevão, a Trilha da Barriguda.
Da nossa parte, houve lembranças do Galo da Madrugada, da Pitombeira dos Quatro Cantos, do Maracatu de Dana Santa, do Espetáculo da Paixão de Cristo, em Nova Jerusalém, do Carnaval de Olinda, das Igrejas barrocas do Recife e Olinda, da tradicional gastronomia pernambucana.
Mas, o foco principal da conversa teria como motivação o projeto, pioneiro e arrojado, dos Falares Regionais, as diversidades e influências da língua falada, do plurilinguismo e dos falares típicos de cada região do Brasil, com as suas palavras especiais e os seus muitos tipos de variações linguísticas.
Na verdade, Helô é “doida” por poesia, já publicou antologias de mulheres poetas. Ela disse em entrevista recente que sempre pensa na poesia como um farol que ilumina o que vem por aí. Para ela, “a poesia é prima-irmã da filosofia e tem a potência da palavra condensada”. Entrando na Academia Brasileira de Letras, nessa Casa povoada de História e de histórias, já se sabe das maravilhas. Não será apenas uma musa.
Marcus Prado – jornalista