Um ano do “Satã 2” – por Marcus Prado.

Completa um ano hoje, dia 1º de março, uma notícia que deixaria o mundo em alerta, o anúncio do presidente russo Vladimir Putin,  segundo o qual  dava por concluídos os testes de uma das suas mais poderosas armas e  a qualificava como “invencível”, “indetectável” e “sem limitação de alcance”, “capaz de cruzar os polos e de provocar o mesmo impacto tanto na Europa quanto nos Estados Unidos”: o novo míssil balístico intercontinental, o RS-28 Sarmat, que a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) chama de “Satã 2”. Segundo Putin, o míssil é capaz de lançar 15 ogivas nucleares em qualquer lugar do mundo e faz qualquer país “pensar duas vezes” antes de fazer ameaças contra a Rússia, pois a arma “é capaz de superar todos os meios modernos de defesa antimísseis”. Conforme uma associação norte-americana que luta contra a proliferação de mísseis, seu potencial seria equivalente ao de 12 bombas atômicas “clássicas”, indetectáveis.

Se é verdade o rumo dessa notícia, que poder das trevas conseguirá uma engenharia diabólica tomar forma de ogiva nuclear com tamanha potência de destruição? Seria a figura de Lúcifer vista pela Otan? É a mesma serpente que no Paraíso tentou Adão, o mesmo Satanás que, no deserto, desafiou Jesus, o Salvador do Mundo? É aquele que caiu do céu, como um raio, citado em Lucas 10:18? Ele é o Diabo, o Dragão Satã, que parece a Serpente, amarrada por mil anos, que arrastou consigo a terça parte dos anjos celestes, descrita em Apocalipse 20:2?  Será o ser maligno descrito pelo poeta florentino, o divino Dante Alighieri, (1265-1321) na sua obra magna A Divina Comédia? O mito do Diabo enfrentaria a força dos teólogos dos séculos XII-XIII até a época moderna. No outono da Idade Média tornou-se objeto de acirrados debates, pelo que se denota na obra magistral de Johan Huizing (1872-1945).

Botticelli (1445-1510), amante da beleza, desenhou uma fera repulsiva para ilustrar o Satã de Dante. Na sua Biografia do diabo, o crítico Alberto Cousté (1940-2010) afirma que o Diabo é uma imensa dor de Deus. É visto nas narrativas de grandes autores do cânone ocidental. O escritor Eça de Queirós (1845-1900) no conto O Senhor Diabo afirma que Satã é a figura mais dramática da História da Alma. O mesmo será visto por Goethe (1749-1832), Willian Blake (1757-1827), Lord Byron (1788-1824), Honoré de Balzac (1799-1850), Victor Hugo (1802-1885), além de Dostoiévski (1821-1881), Charles Baudelaire (1821-1867), Thomas Mann (1875-1955). Grandes vultos das nossas letras, do romance, da dramaturgia, das artes e do cinema, dentro dos rigores imperativos estéticos, fazem pensar nesse execrável e tinhoso personagem, aquele que perambula sem rumo certo pela terra, cujo nome as pessoas preferem não pronunciar. O tema fora já visitado no Brasil por Machado de Assis (1839-1908), Gregório de Matos (1636-1696), Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982), Guimarães Rosa (1908-1987) – A subjetividade do personagem Riobaldo entre Deus e do Diabo; na obra fílmica de Glauber Rocha (1939-1981), nas pistas analíticas lançadas por Gilberto Freyre (19001987), no teatro e no romance de Ariano Suassuna (1927-2014), na ficção de Eduardo Galeano, (1940-2015), nos ensaios de Antônio Cândido (1918-2017). O demônio é visto no Teatro e na ficção de Osman Lins (1924-1978), no romance e no Teatro de Hermilo Borba Filho (1917-1976); na arte de Gilvan Samico, (1928-2013), no Teatro de Ladjane Bandeira (1927-1999), na sua única peça, A Viola do Diabo, injustamente esquecida, (como tem sido também esquecida a sua grande pintura), sem falar da nossa secular literatura de Cordel. A arte, no mundo inteiro, tem sido uma ferramenta escolhida para retratar o imaginário do Satã, a Serpente primordial do Caos, a obsessão diabólica vista atualmente em 30 regiões do mundo com a presença de conflitos armados.

Marcus Prado – jornalista

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