As pedras patrimoniais de Olinda – por Marcus Prado.

“As pedras olindenses têm sofrido um desgaste alarmante.” (Cláudio Aguiar)

As “Rimas Pétreas”, do divino Dante Alighieri (1265-1321), sobre uma mulher tão bela e dura como uma pedra, a tradição simbólica das pedras, o entendimento e a transmissão dos atributos das pedras como matéria de arquitetura e arte, fazem-me lembrar das raras pedras seculares do sítio histórico de Olinda, as que restam do patrimônio pétreo em ruas da cidade – calçamentos e calçadas.Um patrimônio precioso, exemplo icônico que deveria ser preservado, pelo que nos diz, também, do simbolismo milenar das pedras, não só na arqueologia ao redor do globo pelas mais distintas culturas. São muitos os sentidos históricos, filosóficos, poéticos e até mesmo épicos e sagrados atribuídos às pedras.

Existem pedras que fazem cantar, produzem sons e entoam cantos quando se chocam com outras pedras, fenômeno que ouvi dizer quando estive em visita ao sitio Passagem das Pedras (Serra Talhada). Você só ouve o som das pedras. É bom lembrar que as peripécias sonoras do vento saindo das pedras estão no “Grande Sertão: Veredas”, de João Guimarães Rosa. (1908-1967).

As calçadas e calçamentos em pedra portuguesa, segundo historiadores, tornaram-se um símbolo da formação de Olinda, “quando a cidade se consolidava como sede da Capitania de Pernambuco, no período áureo da economia de cana de açúcar”. A qualidade da pedra influenciava significativamente a durabilidade da construção. Um tema visto na erudita defesa de doutorado da professora Juliana Cruz de Santana (UFPE, UNIBRA): “Os materiais construtivos do edificar de Recife e Olinda”. O material pétreo da arquitetura, diz a autora, simbolizou a necessidade de edificar para durar, fazendo uso das possibilidades construtivas da época. Foi desta maneira que as edificações eram estruturadas em Olinda e, mais tarde, no Recife.

Tipos de pedras exploradas em Portugal vindas de Lisboa, são ainda vistas nas ladeiras de Olinda, embora grande parte tenha sido removida ao longo dos séculos. Eram trazidas nas embarcações que vinham buscar as riquezas naturais da colônia. Pedras usadas para adernar as embarcações. O trabalho da professora. Juliana atende a altos padrões de rigor de pesquisa e interesse.

O escritor Cláudio Aguiar, no seu excelente livro “A Casa de João Fernandes Vieira”, descreve sobre a talvez mais olindense e histórica casa de Olinda, um dos mais significativos testemunhos edificados do patrimônio cultural de Pernambuco. O foco das suas páginas iniciais são as antigas calçadas e calçamentos do sitio histórico, a começar pela Rua de São Bento e do seu entorno, tombado, do Mosteiro de São Bento e a sua abadia.

Esse livro é resultado de um levantamento meticuloso e pesquisa historiográfica, uma referência primordial na melhor bibliografia de Olinda do passado. O livro “Arquitectura Popular em Portugal”, uma obra coletiva, fartamente ilustrada, editada há menos de um mês pelo influente jornal “Público” (Lisboa) traz fotos, ampliadas, de calçamentos de pedra da metrópole portuguesa no século XVIII. Comparando as pedras em uso nas vias públicas de Lisboa desse período, a sua pavimentação, com as pedras existentes ainda hoje no sitio histórico mais tradicional de Olinda, não há como distancia-las.

Marcus Prado – jornalista

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