– Olá, meu petiz, peralta vadio
escute uma cousa, chegue-se a mim…
– por que está a enumerar
e, cuidadoso a guardar
tanta bugiganga
no seu bolso de “menino levado”,
que só faz diaburas
de ninguém poder mais suportar?
Esvazie o seu bolso.
Quero ver
o que, com tanto egoísmo
colecionou
e nele guardou!
Ó gente!…
o senhor é fiscal
para me “correr”?
não fiz nenhum mal
para assim proceder.
– Não, meu petiz,
apenas quis
que você mostrasse os brinquedos
que o seu bolso contém,
porque o fazendo,
recordo, agora,
o tempo de outrora
quando, como você
era eu menino, também.
– Não se zangue, por isso, amiguinho,
é, com ansiedade
que, movido pela Saudade,
quero ver, se os brinquedos seus
são iguaizinhos aos que foram meus.
– Pois bem, velho amigo do papai,
ser feita, agorinha, vai
a sua vontade…
e, aqui, em suas mãos,
o meu bolso de menino
tão traquino,
recheado de brinquedos
que, só pra você, vou contar
e enumerar
1º) Repare bem: um bonito pinhão
que jogo sem canseira,
com afiada ponteira (joga o pinhão)…
e que, de tanto rodar e zunir (apara-o),
fazendo: zum… um… um!…
parece até dormir,
e, como gente, sonhar, sonhar!
2º) A atiradeira!…
Chi!… com um seixinho
marco o alvo tão certinho
que nada escapa
num tremendo: “bateu, morreu”! (atira)
3º) brinquedo, meu velho
bolinhas de gude!…
ah! nem é bom falar
nas frequentes jogadas
nas calçadas (joga um instante)
4º) Agora vem o realejo!…
outro brinquedo não vejo,
mais divertido,
que faça sambar
e até rebolar
a meninada
desenfreada (toca e samba)
5º) tampinhas de garrafas!…
com elas faço rodas de carrinhos
que se põem a locomover
em disparada a correr (mostra e movimenta um)
6º) brinquedo: – caixa de fósforos para acender
(acende depressa um fósforo)
– Um perigo!… (grita a mamãe
Com fogo, menino, não se deve brincar
Porque um incêndio pode lavrar!)
7º) Agora é a vez do apito!…
Lá, em casa, fica tudo taciturno
quando, imitando o Guarda Noturno,
resolvo, então,
sem a devida licença esperar,
apitar, apitar, apitar, assim: (apita forte)
(continuando a esvaziar o bolso):
– “o restinho nada vale”
filme quebrado
ponta de lápis,
caixa vazia…
– Pronto! Eis, meu amigo,
um bolso recheadinho
de menino levadinho!
– Então, ficou satisfeito?…
– Mas… que vejo?… Que é isto?…
Por que, meu amigo está chorando…
e as lágrimas, assim, enxugando?!…
– É que, também, fui criança,
e, não me sai da lembrança
o tempo que,
como você,
meu petiz,
fui puro, bom,
alegre e feliz!
do livro SILENTE QUIETUDE.
Albertina Lagos